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As feministas malucas de internet e os homens (sempre sãos)

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Quarta-feira eu participei de uma palestra/debate/conversa na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (SP). Falei sobre feminismo, respondi perguntas, fiz oversharing sobre coisas da minha vida. O usual. (inclusive, me chama aí pra sua faculdade, também, eu adoro.)

No final, já do lado de fora da faculdade, um aluno veio me questionar sobre “o papel dos homens no feminismo”, pois eu havia falado durante a palestra sobre espaços exclusivos para mulheres. Confesso já não ter muita paciência para discutir “homens no feminismo”. Não que isso seja desimportante. É que nos últimos tempos o tema tem vindo muito à tona, e gastamos tempo e energia explicando nossos pontos de vista, que sequer são unânimes no movimento.

Então, explicarei o meu ponto de vista.

O aluno disse que eu fui cuidadosa ao falar dos homens, mas que na internet às vezes as mulheres parecem meio raivosas. “Por que não somos, na internet, como somos em eventos presenciais?”, ele me perguntou.

Eu o questionei sobre quantos eventos presenciais ele foi. Porque em todos que eu fui, os homens foram muitíssimo bem recebidos. Tive poucos episódios de irritação com perguntas sem noção ou comentários machistas. Em geral, eles escutam, aprendem, repensam. Acho super válido.

Na internet, infelizmente, as coisas são diferentes. Porque nós, mulheres, também somos tratadas de forma diferente. Ontem o Think Olga tuitou: “Em 2006, pesquisadores da Universidade de Maryland criaram perfis falsos em salas de bate-papo. Aqueles com nomes femininos receberam, em média, 100 mensagens violentas e de cunho sexual por dia. Já os masculinos, apenas 3,7.”. 

Notem: a pesquisa abordou apenas nomes femininos/masculinos, e a misoginia se fez presente. Quando se é feminista na internet, a situação piora muito. Também ontem criou-se a hashtag #FeministsAreUgly. Há alguns dias, #WomenAgainstFeminism (com vários perfis fake recém criados tuitando freneticamente).

A contraofensiva dos machistas, misóginos e apenas babacas mesmo irrita. Tem vezes que são tão patéticos que dá vontade de rir. Mas há ocasiões em que se torna impossível achar graça. O bullying virtual contra feministas é intenso. Mas a vida real é ainda pior. Neste momento, por exemplo, estamos lidando com um serial killer feminicida em Goiânia. Não há um dia em que não tenhamos notícias medonhas sobre violência contra a mulher, repressão sexual, estupros.

Além do publicado pela grande mídia, a “feminista de internet” conhece casos de garotas e mulheres que escrevem para ela. Participamos de grupos em que histórias horrendas são contadas. Manter o bom humor depois disso é bem difícil.

E por que deveríamos ser dóceis? “Assim vocês agregariam mais pessoas”, me respondeu o moço e me respondem muitas pessoas. Não acho que seja necessariamente por aí. As pessoas esperam docilidade porque esta é uma característica dita feminina. Ninguém gosta de mulheres que falem mais alto. Que gritem. Que se imponham. Esse é o papel do homem, certo?

Pois é. Por isso, os replies e comentários recebidos são em grande parte demandando algo. Querem explicações, mas querem pra ontem. Têm preguiça de ler um texto, dar um google, ou apenas serem educados. Faz parte do entitlement masculino: eles acham que temos que mastigar tudo para eles. E aqui entra o meu ponto de vista, o mesmo sobre o qual falei para o aluno lá em Rio Preto:

No meu feminismo, homens são bem vindos como aliados. Mas eles têm 90% dos cargos eletivos, 90% das diretorias de empresas. Eles têm espaços e grana para discutirem o assunto entre si, caso decidam “desconstruir a masculinidade” (tá na moda) e acabarem com o machismo, já que aparentemente eles estão se sentindo pressionados com a existência dele (oprimidos, não, nunca. por favor não repitam isso jamais).

No entanto, para a maioria dos homens, acabar com o machismo seria acabar com privilégios, e eles não querem isso. Por que abririam mão dos salários maiores, do livre acesso ao corpo da mulher e do espaço público? Por que dividiriam o bolo conosco? É bacana ver homens na plateia de eventos feministas, mas estes ainda são minoria.

Meu feminismo, então, é para lutar pelas mulheres. Pelos homens, que lutem eles. Eu quero empoderar mulheres para que elas percebam quão inteiras elas são. Que são gente. Que têm direitos. Que são fortes. Que não precisam de mais ninguém. Que a aprovação masculina não é necessária. Que as outras mulheres são iguais a ela. Que elas não estão sozinhas.

Meu tempo, meu esforço, meus textos e meus estudos intensos são com esse fim. Caso os homens decidam ter um pouco de humildade e chegarem numa boa para conversar, sem impor pontos de vista sobre um assunto que eles desconhecem e não sentem na pele, eu serei toda ouvidos. Enquanto isso não acontecer, vou continuar sendo uma feminista maluca de internet.

Leia também: O papel dos homens no feminismo.

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